Nos últimos anos houve uma perseguição em massa contra a comunidade LGBTQIAPN+ e um número cada vez maior de casos de feminicídio. Embora tenhamos conquistado uma mudança de um governo fascista para algo mais democrático, infelizmente a situação ainda continuará irreversível por um bom tempo e até lá caberá a cultura nos mostrar o que realmente está acontecendo. Serial Kelly escancara o lado feroz de uma mulher que não aceita mais essa violência, colocando para fora toda a sua fúria.
Título: Serial Kelly |
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Ano de Produção: 2022 |
Dirigido Por: René Guerra |
Estreia: 24 de novembro de 2022 |
Duração: 82 min. |
Classificação: 16 anos |
Gênero: Ação. Comédia. Drama. Crime. |
País de Origem: Brasil |
Sinopse: Kelly (Gaby Amarantos) está sempre na estrada fazendo shows de forró pelo Nordeste. Mas quando está fora dos palcos, ela revela sua faceta de serial killer, matando homens e deixando um rastro de sangue por diversas cidades do Alagoas. Quando três crimes são descobertos pela polícia, ela usa a sua turnê musical para escapar das investigações. Em fuga, a cantora ficará conhecida como Serial Kelly. |
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Dirigido por René Guerra, o filme conta a história de Kelly (Gaby Amarantos), uma cantora de forró eletrônico em busca de ascensão. Ácida e transgressora, Kelly é forte, dona de si e dona de seus desejos. Ao cumprir uma agenda de shows em casas noturnas sertanejas, ou “inferninhos”, Kelly faz shows pelo sertão do Brasil, mas não tem muitas oportunidades significativas. Para que sua carreira se torne um sucesso, ela acaba indo longe demais, fazendo de tudo para alcançar seus objetivos, inclusive matando algumas pessoas pelo caminho.
O sertão é um cenário propicio para falar um pouco sobre o Brasil independente de qual período histórico. No cinema Novo, por exemplo, Glauber Rocha lançou a sua maior obra prima que foi Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), em que a luta pela sobrevivência naquele cenário já perdurava por anos e cuja cruzada prossegue até nos dias de hoje.
No século XXI, além do enfrentamento da seca e da fome, o sertão brasileiro enfrenta outros males, que vai desde a violência contra a mulher, ao preconceito contra a comunidade LGBTQIAPN+, gerando uma onda de sangue e mortes. Serial Kelly é apenas uma representação da superfície desse assunto, mas que já nos passa uma noção daquele universo escondido pela mídia cega e sensacionalista.
Embora novata no ramo da atuação, a cantora e compositora Gaby Amarantos surpreende em uma atuação digna de nota, em que por meio de seu olhar, ela constrói para a sua personagem todo um ser moldado por cicatrizes físicas e emocionais e da qual a personagem diz chega para consigo mesma e não hesitando em eliminar aqueles que podem lhe abusar.
Moldada de acordo como a vida lhe ensinou, o seu dia a dia em meio ao sustento por intermédio das músicas tocadas em inferninhos sintetizam uma realidade sem muitas opções, a não ser sobrevivendo com o que tem em mãos, seja pelo microfone que lhe dá a vida, como também uma faca que pode lhe dar um ponto final em sua cruzada.
Em meio a isso temos uma detetive, interpretada Paula Cohen, que procura fazer justiça de forma coerente, mas não escondendo para si o fato de ter que jogar conforme ela vai adentrando ao submundo da violência contra a mulher e cujo machismo se encontra impregnado até mesmo no seu próprio trabalho.
Aliás, ela é uma espécie de guia para nós com relação aquele universo, por vezes, conservador, hipócrita e que usa Kelly como uma espécie de cortina de fumaça para ocultar toda essa grande piada. A cena em que a detetive é procurada para ser entrevistada em um jornal sensacionalista é digno de nota, pois não passa de uma grande piada, mas que, infelizmente, se encontra em nossa realidade das redes de TV aberta hoje em dia.
Apresentado em forma de capítulos, o filme possui uma linha temporal, por vezes, não linear, fazendo com que testemunhamos já o destino traçado para a protagonista, mas até sabermos o que acontecerá a trama vem e volta no tempo e formando assim um verdadeiro mosaico de informações que nos força ter maior atenção ao longo do percurso.
A protagonista busca por uma redenção, mas também compreende que o seu destino pode se tornar trágico, mesmo não se arrependendo de nenhum dos seus atos. Ao final, concluímos que não há nenhum vilão ou herói dentro da história, e sim somente pessoas com as suas falhas e que essas são mastigadas por um sistema viciado, falho e que tão cedo não há um conserto para isso.
Serial Kelly é um retrato de um sertão atual, que se difere do que Glauber Rocha nos havia passado um dia, mas cuja batalha árdua continua sempre a mesma.
As opiniões contidas neste post são de cunho pessoal e não refletem necessariamente a opinião do Teoria Geek.
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