Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore | Confira nossa crítica

"Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore", novo filme da franquia, é uma longa e melancólica espera pelo fim.
Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore
Ficha Técnica
Título: Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore
Ano de Produção: 2022
Dirigido Por: David Yates
Estreia: 14 de abril de 2022
Duração: 2h23min
Classificação: 10 anos
Gênero: Fantasia/Aventura
País de Origem: Inglaterra
Sinopse: O professor Alvo Dumbledore (Jude Law) sabe que o poderoso mago das trevas Gellert Grindelwald (Mads Mikkelsen) está se movimentando para assumir o controle do mundo mágico. Incapaz de detê-lo sozinho, ele pede ao magizoologista Newt Scamander (Eddie Redmayne) para liderar uma intrépida equipe de bruxos, bruxas e um corajoso padeiro trouxa em uma missão perigosa, em que eles encontram velhos e novos animais fantásticos e entram em conflito com a crescente legião de seguidores de Grindelwald. Mas com tantas ameaças, quanto tempo poderá Dumbledore permanecer à margem do embate?

 

Harry Potter era a grande franquia multimilionária dos anos 2000. Antes da Disney se tornar dona da Marvel, Star Wars e afins, antes dela dominar o mercado (e aprisioná-lo: vide a quantidade de salas que passaram “Homem Aranha: Sem Volta para Casa” em detrimento de, por exemplo, “Matrix Resurrections” e “Amor, Sublime Amor”, de Steven Spielberg; e vide também este vídeo do Tarantino – infelizmente, apenas em inglês – contando como a Disney tentou impedir que “Os Oito Odiados” passasse em um cinema de Los Angeles), a franquia do Mundo Mágico era a que levava milhões de pessoas para as salas de cinema, que juntava a nata dos atores britânicos e por aí vai. Dez anos depois do fim da franquia Harry Potter, os prequels de Animais Fantásticos atingem um misto inesperado de confusão e melancolia.

Parece ser producente pensar na franquia como um produto, resultante da sede por capital de seus produtores, do ego e polêmicas de sua autora J.K. Rowling e da legítima nostalgia e paixão dos fãs. No meio dessa mistura, difícil também não considerar o afastamento de Johnny Depp e a pandemia. Entra Mads Mikkelsen no papel de Grindelwald e reestrutura-se o roteiro, mudando, por exemplo, as cenas que se passariam no Brasil por cenas no Butão. É, portanto, um descarrilhamento total de intenções, ideias e rumo, também causados pelos fracassos dos episódios anteriores. Tudo isso faz com que “Os Segredos de Dumbledore” seja uma longa e prolixa espera pelo fim.

Newt Scamander (Eddie Redmayne) mais uma vez precisa juntar sua trupe de bruxos e o trouxa Jacob Kowalski (Dan Fogler) para pôr em prática os planos de Dumbledore (Jude Law), que não pode atacar Grindewald por causa de um pacto de sangue que ambos fizeram quando ainda eram jovens e tinham um relacionamento amoroso. Para enganar o vilão, que tem o poder de ver o futuro, os planos são propositalmente arbitrários sem que necessariamente os heróis cheguem a lugar nenhum. Como uma imagem ficcional para todo o rolo que se tornou Animais Fantásticos.

O que não deixa de ser curioso é que esse sentimento de falência total é justamente o que dá algum ar de “coesão” para o projeto. De novo comandado por David Yates, que demonstrara na franquia original uma certa sensibilidade melancólica nos capítulos que dirigiu, o filme escanteia Newt e assume Dumbledore como o protagonista, e mestre marionetista da trama. E são seus traumas familiares que dão o tom. É com uma memória dele que o filme abre e é a partir do sentimento de perda que a próxima sequência já mostra a morte de uma das criaturas fantásticas que dão título à série. Existe até uma preocupação de Yates, principalmente neste início, com um certo “pé no chão”, de planos detalhes em rochas, xícaras de chá, escamas de um animal, como se tentasse localizar esse mundo mágico num nível mais material e pessoal.

Mas, a encenação mais contida do diretor nunca soube lidar bem com as exigências de projetos grandiosos, múltiplas tramas que se entrelaçam e cenas de ação. Ainda mais com o desencanto com o mundo substituindo o maravilhamento, nem mais um dos maiores chamativos deste cinema fantástico – as criaturas, locais e peculiaridades da realidade mágica – estão presentes. Hogwarts e Hogsmeade, agora bem mais digitais do que os cenários grandiosos construídos para os filmes de Harry Potter, tornaram-se fantasmas apagados de outrora. O clímax do filme, uma espécie de vila em CGI acinzentado, representa bem uma certa tendência do blockbuster contemporâneo de falta de criatividade (e de produtos padronizados muitas vezes criados por funcionários em péssimas condições de trabalho nas empresas de efeitos visuais).

Ainda que podado e organizado por Steve Kloves, argumentista dos Harry Potters que tenta arrumar o caos da narrativa mais literária do roteiro de Rowling, são as preocupações e visão de mundo da autora que se sobressaem. Se Voldemort já era uma materialização de um ideal fascista e supremacista bruxo, Grindelwald assume de vez sua disposição de ser o Hitler do mundo mágico, sendo um dos representantes, escolhido na Alemanha, para as eleições de Chefe Supremo da Magia. O que até rende momentos interessantes que tentam colocar elementos de um thriller político na história. Mas, a visão limitada da autora faz com que a alegoria política seja, não só infantilizada, quanto puramente antidemocrática, com sua solução para as eleições que ignora a vontade do povo e acontece através de um “ser iluminado”. Falta de visão essa que talvez também ache que meia dúzia de frases de personagens assumindo relações homossexuais servem como bandeira de representação e visibilidade. Mais provavelmente, é apenas uma tentativa cínica para chamar o público para um filme esquecido.

Como produto de franquia, ligações entre as séries precisam ser feitas, e as incertezas do futuro quanto ao próximo capítulo impedem uma progressão narrativa. O cúmulo é que mesmo o embate final precisa acontecer fora de uma certeza material, de forma que, se a série acabar por aqui, o conflito foi resolvido; se continuar, ainda pode acontecer da forma que deve acontecer. É o que se tornou o Mundo Mágico: um vazio de visão criativa narrativa, política, visual, expressiva.

“Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore” é, portanto, uma representação acurada do caos que reina em sua produção. Um carrossel, dando voltas em falso, sem direção a seguir e sem nada para apresentar. Se o personagem de Dumbledore se assume como um avatar de todos os perdidos e desiludidos criadores e instigadores dessa confusão, é também um possível avatar para os fãs. Cujo olhar melancólico da cena final vê, ao longe, um mundo acolhedor e nostálgico do qual ele não consegue mais fazer parte.

“Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore” está disponível na HBO Max.

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