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A Casa do Dragão: Primeira Temporada | Confira nossa crítica

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Ficha Técnica
Título: A Casa do Dragão
Ano de Produção: 2022
Dirigido Por: Miguel Sapochnik e outros
Estreia: 21 de agosto de 2022
Duração: 10 episódios
Classificação: 16 anos
Gênero: Drama/Fantasia
País de Origem: EUA
Sinopse: Os apoiadores de Aegon Targaryen entram em conflito com os adeptos de sua meia-irmã, Rhaenyra, pelo trono de Viserys I, seu falecido pai, iniciando uma guerra civil cerca de 200 anos antes dos eventos retratados em “Game of Thrones”

 

 

Entre “A Casa do Dragão” e “Os Anéis de Poder”, a fantasia medieval anda bem representada nas telas das TVs. Enquanto a série de “O Senhor dos Anéis” aposta no grande espetáculo blockbuster, de efeitos visuais milionários e mundos mágicos, “A Casa do Dragão” só é expansiva no tempo em que a história se passa e na quantidade de personagens, mas prefere restringir seus conflitos em intrigas palacianas e na intimidade das protagonistas. O mais curioso nesta comparação inevitável entre as duas séries é que, apesar de “Os Anéis de Poder” basear a narrativa em apêndices e notas escritos por Tolkien para sua trilogia principal, é a prequela de “Game of Thrones” que tem mais dificuldade de organizar os acontecimentos de várias décadas que levaram à Dança dos Dragões em uma temporada fluida e sem solavancos.

“A Casa do Dragão” começa com a coroação do Rei Viserys como Senhor dos Sete Reinos. O problema é que o cargo deveria ser de Rhaenys, que foi impedida de ascender ao trono por ser mulher. A questão da hereditariedade é essencial para essa nova empreitada a partir dos escritos de George R.R. Martin. Para evitar os conflitos no reino, Viserys nomeia sua filha Rhaenyra como sucessora, mas a esposa do Rei, Alicent Hightower, tem outros planos, querendo que seus filhos entrem para a linha sucessória do trono. A discussão que a série propõe, e aparece bem explicitada na abertura dos episódios, é que, se o sangue é tão importante para o poder de monarcas e lordes, quem verdadeiramente garante os laços sanguíneos são as mulheres, e elas são excluídas do jogo de poder.

Para dar conta de reinados inteiros e décadas de politicagem, a série se estrutura em diversos saltos temporais entre episódios. A narrativa avança em direção à guerra entre Rhaenyra e Alicent, final óbvio para a temporada. Mas, nessa toada, o turbilhão de Casas, conflitos e personagens passam batido por boa parte da primeira metade, ora pela dificuldade de acompanhar os novos acontecimentos, ora porque vários conflitos são resolvidos fora da tela e personagens aparecem e desaparecem de acordo com a necessidade de encaminhar o embate entre as princesas. O que, por um lado, impede maior envolvimento com papéis secundários e subtramas, por outro confirma o protagonismo das duas mulheres, impedidas de assumir esse mesmo protagonismo em Westeros, pelas mãos e pelas leis dos homens.

É quando a série diminui o ritmo para acompanhar mais detalhadamente os bastidores do poder que ela traz o que tem de melhor. Os grandes momentos da temporada são os de reuniões de conselheiros do rei, de casamentos ou jantares. Por exemplo, os últimos episódios de Milly Alcock como Rhaenyra, que se aprofundam no envolvimento da princesa com o tio Daemon, interpretado por Matt Smith. Ou o ótimo quinto episódio, no qual o banquete de casamento entre Rhaenyra e Laenor é todo encenado a partir dos olhares dos personagens. Cada conflito é expresso sem falas, mas com raccordes de olhar, ou seja, quando a montagem intercala um plano de alguém vendo algo para outro que mostra o que ela viu. A dança dos convidados do banquete se transforma num tenso jogo de relações interpessoais que se alteram o tempo todo e de confrontos silenciosos.

“A Casa do Dragão” deixa o sentimento de ser um experimento, de tentativa e erro, nas escolhas narrativas que faz. A troca das atrizes de Rhaenyra e Alicent, que passam a ser interpretadas por Emma Darcy e Olivia Cooke, não deixa de ser abrupta, uma quebra que demora a se ajeitar, até porque existe uma distância temporal que suprime as mudanças pelas quais ambas as personagens passaram e elas acabam soando como pessoas diferentes. Mas, é claro o crescendo de qualidade da série a partir da metade. Nesse sentido, mesmo a questão feminina sofre com as incertezas na condução. Inicialmente, o constante sofrimento das mulheres no seriado se aproxima de uma exploração exagerada. Como se simplesmente mostrar os abusos causados pelos homens servisse como uma denúncia e uma crítica. Já o último episódio parece encontrar uma boa saída. A cena do parto, sanguinolenta, rima com aquele do primeiro, só que aqui, além de servir de metáfora para a violência perpetrada pela busca do poder através das linhas sucessórias, também demonstra um passo de Rhaenyra para tentar ter controle pelas próprias escolhas. Sua mãe morreu pela escolha de terceiros, para tentar salvar o filho. Rhaenyra escolhe o seu destino por conta própria.

Ainda nessa discussão de nascimento, morte e sucessão, que perpassa toda a série, é preciso destacar o trabalho de Paddy Considine como Viserys e a maquiagem e efeitos visuais usados para representar seu envelhecimento e doença. Em momentos como o do parto e esse, “A Casa do Dragão” demonstra como o grotesco pode ser bem utilizado para criar imagens impactantes e de peso dramático. O último jantar entre as famílias é tão bem encenado quanto o casamento do quinto episódio e a situação do rei com a filha e a esposa, a antiga amizade que se diluiu pelo poder e pelo jogo dos homens, é muito mais significativa do que qualquer cena que envolve dragões ou batalhas. Que, verdade seja dita, seguem um padrão meio realista e pouquíssimo imaginativo, assim como várias das produções de fantasia que vieram na esteira sombria de um Christopher Nolan.

Esta não é uma série de grande apelo estético para o fantástico. Os dragões são secundários e raramente a interação entre as criaturas e os humanos são bem-sucedidos visualmente. O mesmo acontece com os grandes cenários criados por CGI. O foco é mesmo nos detalhes dos figurinos e nas ambientações internas, nos códigos culturais e nas intrigas pessoais. Numa certa “mise-en-scene social”, dos costumes, regras e modo de vida de uma sociedade e como esse conjunto cultural pode exercer uma opressão ou ser quebrado de acordo com o interesse de quem nele vive. A série está, portanto, mais próxima de um romance gótico vitoriano do que de um épico medieval. Daí também o tom melancólico que ela carrega e a propensão por demonstrar o lado sombrio de seus personagens.

Entre os percalços, é bom ver que “A Casa do Dragão” consegue administrar o conflito principal numa escala menor, confiando na encenação e nos atores para manter os eixos de uma história longa e confusa. “Game of Thrones” sofreu quando teve que deixar de lado as intrigas palacianas para tratar do épico embate entre humanos e White Walkers. A ver como, com o começo da guerra, a série vai lidar com a escala que certamente deve crescer. Por enquanto, esta primeira temporada é um bom (e contido) conto sobre sangue, hereditariedade, poder e patriarcado.

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